Veja se você precisa se preocupar com ela.
Todos sabemos que quando viermos a partir deste mundo podemos deixar bens aos nossos herdeiros. Neste sentido normalmente pensamos em imóveis, veículos, saldos em contas bancárias, empresas e até investimentos, mas você já pensou o que vai acontecer com suas redes sociais, sites e blogs onde você coloca seus conteúdos?
Hoje os sites, blogs e redes sociais são um canal de vendas para muitas pessoas, como no caso dos autônomos. Esses canais muito embora na maioria das vezes não sejam vendidos para terceiros, acabam sendo uma verdadeira fonte de renda para milhares de pessoas, e que pode ser aproveitado por outras pessoas, que atuem no mesmo ramo.
Agora imagine uma pessoa que tire toda sua renda por meio de um canal monetizado no Youtube, ou que venda cursos por meio de sua própria rede social, ou até mesmo uma pessoa que seja proprietário de um site de vendas que é apenas um intermediário entre o fornecedor e o comprador (dropshipping). Essas pessoas podem possuir verdadeiras fortunas em bens que não são materiais, mas que são altamente lucrativos, que podem (na verdade devem) ser passados para seus herdeiros, uma vez que possuem um alto valor econômico.
Para essas pessoas, o conteúdo digital é muito mais valioso do que qualquer bem material deixado, uma vez que pode ser uma verdadeira fonte de renda inesgotável.
No Brasil, a herança digital é um tema pouco abordado, onde muitas vezes o que é judicializado não necessariamente possui um valor econômico, mas sim afetivo, como, por exemplo, a manutenção das redes sociais de pessoas que já faleceram. Para alguns pais, a manutenção da rede social acarreta num sofrimento, que lembra a cada instante do ente que se foi, já para outros serve como um consolo, pois ao permanecer com a rede social ativa, os pais podem ver as fotos e até conversas daquele filho que já não está mais ali.
Por não existir legislação específica que trate do tema, o judiciário é quem acaba por resolver esse tipo de conflito. Aqui em Mato Grosso do Sul, por exemplo, uma mãe conseguiu por meio de uma determinação judicial, que a conta de uma rede social de sua filha fosse excluída, já em Minas Gerais uma mãe pediu o contrário, para que a rede social de sua filha fosse mantida ativa, mesmo após seu falecimento, no entanto, ela não obteve êxito porque poderia acessar conversas de terceiros, protegidas pelo sigilo da plataforma.
Importante ressaltar que as contas em redes sociais possuem um caráter personalíssimo, de modo que não podem ser transmitidos para herdeiros, até mesmo porque em vida, o usuário adere aos termos de serviço, onde o usuário pode optar pela exclusão ou não de sua rede social após seu falecimento, ou até mesmo transformar seu perfil numa espécie de “memorial”, transmitindo os dados de acesso para terceiros.
Para acabar com essa lacuna legislativa que existe sobre a herança digital, há um projeto de lei (nº 6.468/2019), que propõe acrescentar o parágrafo único ao artigo 1.788 do Código Civil, cujo texto seria:
“Serão transmitidos aos herdeiros todos os conteúdos de contas ou arquivos digitais de titularidade do autor da herança.”
O direito mais uma vez está se adaptando às mudanças na sociedade, atribuindo valores a bens imateriais que até então não tinham valor comercial, mas que agora, com o avanço da tecnologia podem ser verdadeiras fontes de renda para os herdeiros ou para qualquer pessoa cujo falecido pode deixar como beneficiário por meio de um testamento, por exemplo.
E você, já pensou se vai deixar para seus herdeiros algum tipo de herança digital? Já pensou ao menos o que você quer que seja feito com seus perfis em redes sociais após sua partida?
Leandro Amaral Provenzano é advogado especialista em Direito Agrário, Tributário, Imobiliário e Direito do Consumidor. Membro das Comissões de Direito Agrário e Direito do Consumidor da OAB/MS. E-mail para sugestões de temas: leandro@provenzano.adv.br