O judiciário tem aplicado sanções a quem age de má-fé.
Para evitar oscilações de preço, muitos produtores rurais, como forma de proteção financeira acabam realizando contratos de venda futura, fixando determinado preço para seu produto no momento de assinatura do contrato, garantindo assim o preço predeterminado para aquela produção, numa fase muito anterior à colheita, o que traz maior previsibilidade financeira para o vendedor.
Ocorre que sempre que acontece um grande aumento de preços de alguns produtos – à exemplo do que ocorreu ano passado com o preço da soja – ainda que já tenha vendido sua produção a um preço determinado anteriormente, alguns produtores acabam por vendê-la novamente para outros compradores, que pagarão o preço de mercado pelo produto, fazendo com que o produtor descumpra com o contrato anteriormente pactuado.
Em regra, as cerealistas são as grandes prejudicadas com isso, e acabam por amargar prejuízos não só com a não entrega do produto pelo preço combinado (abaixo do valor de mercado), como também muitas vezes, por já terem vendido aquele produto para terceiros, fazendo com que a cerealista também descumpra com seu contrato, acarretando, portanto, num duplo prejuízo a ela, que pode ir além do financeiro, mas também manchando sua reputação.
Para tentar remediar toda essa situação, as partes têm utilizado do contrato “washout”, que é uma ferramenta de acordo para regulamentar o descumprimento de um contrato e fixar as indenizações decorrentes do descumprimento, estabelecendo indenizações, multas, custos reputacionais, danos extrapatrimoniais etc.
O objetivo maior desta ferramenta é a proteção da entrega do produto negociado, impedindo ou, ao menos tornando inoportuno que o produtor redirecione a oferta, de modo que o produtor cubra os custos da sua própria quebra de contrato, pagando o valor correspondente à diferença do preço estabelecido no contrato e o preço de mercado.
As consequências do inadimplemento de um contrato de entrega de safra futura vão muito além daquelas havidas pelo descumprimento de um contrato comum, pois a multa contratual, aquela paga por quem descumpre com o contrato, é muito branda se compararmos o inadimplemento deste tipo de contrato com outro qualquer.
Imagine uma cerealista que adquire uma safra de soja por meio de um contrato futuro, onde, no momento da assinatura do contrato a saca de soja está custando R$ 135,00, mas que no contrato futuro, na data da entrega, a cerealista pagará ao produtor R$ 150,00 por cada saca. Porém, na data da entrega da soja, seu preço está R$ 190,00 no mercado. Neste exemplo, o produtor rural terá muitas vantagens se descumprir com seu contrato e vender seu produto pelo preço de mercado, numa clara demonstração de má-fé.
Por sua vez, a cerealista também já pode ter vendido esse mesmo produto para um terceiro pelo valor de mercado, logo, além de deixar de ganhar R$ 40,00 por saca de soja, ele também terá que arcar com a multa pela quebra de seu contrato, acarretando num duplo prejuízo.
Além das perdas financeiras, há também uma quebra na cadeia do agronegócio com o descumprimento contratual, o que pode deixar com que alguns elos da cadeia fiquem sem o produto, o que pode acarretar prejuízo a diversas atividades rurais que dependam do produto comercializado, como é o caso das cerealistas.
Por acumular a multa da cláusula penal com outra forma de punição, há divergência de entendimentos entre os magistrados, onde alguns defendem que pode haver a incidência de mais de um tipo de penalidade, já outros defendem que tal entendimento traria um prejuízo duplo e, portanto, excessivo para aquele que descumpriu o contrato.
Muitas vezes o que decidirá o caso será a boa fé da parte contratante, uma vez que a quebra de contrato pode ser dar por fato alheio à vontade do produtor, como, por exemplo, a quebra de safra, como também pode ser causada simplesmente porque o preço da comoditie aumentou para valores ainda maiores do que aquele previsto no contrato, o que fez com que o produtor vendesse o produto para terceiros, ainda que ciente da multa contratual que teria que suportar.
Para que haja uma maior segurança contratual, é necessário acrescentar multas mais pesadas e que reflitam a real consequência financeira da quebra do contrato, inclusive uma multa baseada no valor de mercado do produto no momento da quebra do contrato (data da entrega do produto comercializado), além de eventuais prejuízos que não podem ser calculados financeiramente, mas que podem ser objeto de dano moral.
Só com contratos mais assertivos haverá maior proteção da cadeia produtiva, capaz de fomentar um agronegócio mais seguro e previsível.
Leandro Amaral Provenzano é advogado especialista em Direito Agrário, Tributário, Imobiliário e Direito do Consumidor. Membro das Comissões de Direito Agrário e Direito do Consumidor da OAB/MS. E-mail para sugestões de temas: leandro@provenzano.adv.br