Quais as possíveis saídas para o consumidor?
O mundo das viagens ficou incrédulo com a notícia veiculada pela própria 123 milhas na sexta-feira da semana passada (18/08/2023).
No comunicado a empresa de viagens, que comercializa não só passagens aéreas, mas também hotéis, pacotes turísticos e aluguel de veículos anunciou que todas as pessoas que adquiriram pacotes por preços promocionais (chamadas por eles de “promo”), com datas flexíveis para viagens entre setembro até dezembro de 2023 tiveram suas viagens canceladas.
A empresa avisou que disponibilizará para todos esses viajantes “vouchers” com os valores atualizados em 150% do CDI, que varia em média, pouco mais que 1% ao mês.
A declaração da empresa fere claramente as leis brasileiras, em especial o Código de Defesa do Consumidor, pois a empresa de turismo alterou unilateralmente todos os contratos desses milhares de viajantes, e as consequências para empresa podem ser muito maiores do que simplesmente os valores dos pacotes vendidos aos consumidores.
Por alterar unilateralmente o contrato, a empresa pode ser responsabilizada a indenizar todos os consumidores afetados pelo cancelamento em massa das viagens, e essa indenização pode ser tanto pelos danos financeiros (materiais) causados aos passageiros quanto pelos danos morais, que podem ser cobrados na mesma ação.
O dano financeiro pode ser representado por todo prejuízo advindo do cancelamento da viagem pela 123 milhas, por exemplo, se uma família que adquiriu as passagens aéreas pela empresa por quatro mil reais e resolve manter a viagem programada com antecedência, adquirindo novas passagens por dez mil reais, essa diferença de preço das passagens (seis mil reais) terá que ser arcada pela 123 milhas, assim como o dano moral, que é todo aquele dano que não pode ser calculado financeiramente, como por exemplo, a angústia de não ter a situação resolvida pela empresa, que está deixando vários consumidores sem comunicação, por ter que gastar mais dinheiro que o planejado pela viagem, e até mesmo pelo tempo de vida perdido para solucionar o problema, por culpa única e exclusiva da empresa.
Os consumidores possuem todos os direitos acima elencados, o que nos leva a uma outra preocupação. Será que a empresa terá condições financeiras de arcar com esta enxurrada de ações judiciais sem entrar em recuperação judicial?
Esta é uma pergunta que ninguém possui resposta, e que torna a decisão do consumidor muito mais difícil diante dos diversos caminhos que ele pode seguir para lutar pelos seus direitos.
Caminho 1: O consumidor poderá simplesmente aceitar o voucher oferecido pela empresa 123 milhas. De posse desse voucher, o consumidor poderá adquirir viagens, passagens aéreas ou hotéis com datas definidas para tentar resolver seu problema o quanto antes e diminuir o risco de perder todo seu dinheiro. Esta opção é mais indicada para aquelas pessoas que pretendem recuperar o dinheiro (ainda que não dê para realizar a mesma viagem) e evitar o maior risco que é o de não receber nada no caso de falência ou até mesmo de recuperação judicial da empresa. Quando o consumidor já possuir uma passagem aérea ou até mesmo a reserva do hotel, essas novas empresas também passam a ser responsáveis pelos serviços contratados, o que leva o consumidor a não ficar mais dependendo somente da empresa 123 milhas;
Caminho 2: O consumidor pode aceitar o voucher e entrar com uma ação de dano moral e material contra a empresa por causa da frustração da primeira viagem, e o provável aumento do valor da segunda. Mas para isso ele não poderá assinar nenhum tipo de acordo se comprometendo a não entrar com processo contra a empresa. Caso ele assine um acordo desses, ele terá que ser anulado no judiciário, o que já diminui as chances de sucesso do processo;
Caminho 3: O consumidor poderá entrar com uma ação judicial pedindo uma liminar na justiça para que a empresa 123 milhas cumpra com o que foi contratado. Se a liminar for concedida e implementada pela empresa, o consumidor poderá realizar sua viagem conforme o planejado previamente;
Caminho 4: O consumidor poderá ainda não aceitar os vouchers e brigar pelos seus direitos na justiça, dependendo então do judiciário para que a situação seja resolvida, e torcendo para que a empresa possua condições de honrar com todas as condenações sem ter que entrar em recuperação judicial.
Caso a empresa entre em recuperação judicial certamente os consumidores terão ainda mais dor de cabeça com o caso, pois processos de recuperação judicial são gigantescos, complexos e com milhares, neste caso talvez milhões de credores, o que torna tudo mais demorado e ainda mais custoso para todos os consumidores prejudicados pela empresa.
A sorte está lançada, e nem os especialistas no assunto podem te indicar o melhor caminho a seguir, pois todos eles envolvem riscos.
Leandro Amaral Provenzano é advogado especialista em Direito Agrário, Tributário, Imobiliário e Direito do Consumidor. Membro das Comissões de Direito Agrário e Direito do Consumidor da OAB/MS. E-mail para sugestões de temas: leandro@provenzano.adv.br